Alarme às sete e quinze da manhã acompanhado da tradicional vitamina de banana da Dona Nil.
A indisposição acompanhada da obrigação de ir trabalhar num tempo de chuva, de nuvens e de ronco.
Carona diária com o irmão mais velho acompanhada do guarda-chuva azul, presente de aniversário da Dodô.
Foi uma manhã como as outras, exceto a chuva. Não dava pra encher saquinhos de areia, plantar, coletar sementes, fotografar ou ir fazer trilha. Os policiais nunca querem se molhar e os curiosos e aventureiros por mais irônico que seja nunca querem escorregar nas folhas coloridas. As serpentes nunca navegam na areia e as caranguejeiras não saem das suas tocas. Eu amo as manhãs de chuva. O tempo frio me devolve ao Belo Horizonte, o lugar onde tinha o céu a cair diariamente e onde eu resolvi passar as férias de fim de ano.
As manhãs de chuva me dissolvem como algodão doce em saliva quente. Aguça meus sentidos e eu farejo minha infância na vila naval de Belém, correndo na chuva das quatro da tarde ou me escondendo dela dentro da capinha amarela.
Pena é ter a realidade como inimiga da paz e do bem estar.
A felicidade da chuva foi se subtraindo até a ânsia de vômito que me acompanhou durante todo o dia juntamente com uma zabumba que me enfiaram pelos ouvidos até o cérebro.
Foto e fonofobia, falta de apetite e intolerância me deixou um caco. Séria, inacessível. O esforço parcialmente anulado pelo mau funcionamento das máquinas no trabalho vespertino acumulou no meu peito uma energia negativa intratável e o bolo gelado na hora do lanche me lembrou um dos vocábulos preferidos: disgusting.
A cefaléia me impediu de qualquer concentração durante a aula. O que é que tem a surdez congênita e a ciclopia?
De repente uma mensagem via sms me convidava para ir assistir o Distro¹ num evento do curso de Publicidade na Universidade Potiguar. Pensei "Por que não? O lance é reanimar!". Queria me curar das mazelas de um dia cheio e impiedoso. Saí da aula e fui conferir o evento.
Infelizmente cheguei depois da apresentação da banda. Senti tudo meio esquisito. Senti hostilidades e perturbações. Calças, camisetas quadriculadas, casaquinhos fashions e toquinhas de cabelo coloridas com óculos de grau anti-reflexo passeavam de uma ponta a outra com baforadas de cigarro e goles escondidos de bebidas alcoólicas. O estilo dos futuros publicitários. Um cara desafinado tocava Planta e Raiz e Zeca Baleiro no violão elétrico. Por pouco não rolou um Charlie Brown Jr.
O meu endométrio descamava, isquemiado, pela contração das minhas artérias espiraladas: antojo e queda de pressão. Frio.
Dirigi encolhendo os olhos, fugindo da claridade dos faróis e dos sinais. Dirigi com o vidro fechado, sentindo frio e evitando o barulho intenso externo. Estava chegando atrasada em mais um compromisso. Pelo menos uma notícia boa: Congratulations, You improved your English.
Finalmente casa. Agora eu poderia estudar tranquila para a prova de Ecologia Comportamental, poderia falar com bases científicas sobre Altruísmo e Egoísmo; Sobre a equação de Hamilton; Sobre cuidado parental e os Dilemas de vida dos animais, mas infelizmente a cefaléia me parasitava sugando todo o resto de paciência e vontade de aprender, sugando todo o resto são que minha mente ainda preservava.
Às duas da manhã dei baixa no Hospital São Lucas. Fui consultada por um neurologista cinquentão e duas enfermeiras que me serviram pra trocar o soro, me cobrir e dar o medicamento. Não lembro muito bem o que aconteceu, eu não conseguia abrir os olhos e não escutava mais nada direito. Ouvia palavras pronunciadas à toa "dipirona", "enxaqueca", "estresse" bem enquanto me transformava num ser humano letárgico, apático.
¹Distro é: Rafaum Costa: guitarra e voz; Vinícius Menna: guitarra e voz; Beloni Uchoa: baixo; Artur Araújo: bateria. Contatos: http://www.myspace.com/distrorock distroband@hotmail.com (84) 88031396.
Revisão de Texto: Priscila Adélia (jornalismo) e Gustavo Sena (medicina).
A indisposição acompanhada da obrigação de ir trabalhar num tempo de chuva, de nuvens e de ronco.
Carona diária com o irmão mais velho acompanhada do guarda-chuva azul, presente de aniversário da Dodô.
Foi uma manhã como as outras, exceto a chuva. Não dava pra encher saquinhos de areia, plantar, coletar sementes, fotografar ou ir fazer trilha. Os policiais nunca querem se molhar e os curiosos e aventureiros por mais irônico que seja nunca querem escorregar nas folhas coloridas. As serpentes nunca navegam na areia e as caranguejeiras não saem das suas tocas. Eu amo as manhãs de chuva. O tempo frio me devolve ao Belo Horizonte, o lugar onde tinha o céu a cair diariamente e onde eu resolvi passar as férias de fim de ano.
As manhãs de chuva me dissolvem como algodão doce em saliva quente. Aguça meus sentidos e eu farejo minha infância na vila naval de Belém, correndo na chuva das quatro da tarde ou me escondendo dela dentro da capinha amarela.
Pena é ter a realidade como inimiga da paz e do bem estar.
A felicidade da chuva foi se subtraindo até a ânsia de vômito que me acompanhou durante todo o dia juntamente com uma zabumba que me enfiaram pelos ouvidos até o cérebro.
Foto e fonofobia, falta de apetite e intolerância me deixou um caco. Séria, inacessível. O esforço parcialmente anulado pelo mau funcionamento das máquinas no trabalho vespertino acumulou no meu peito uma energia negativa intratável e o bolo gelado na hora do lanche me lembrou um dos vocábulos preferidos: disgusting.
A cefaléia me impediu de qualquer concentração durante a aula. O que é que tem a surdez congênita e a ciclopia?
De repente uma mensagem via sms me convidava para ir assistir o Distro¹ num evento do curso de Publicidade na Universidade Potiguar. Pensei "Por que não? O lance é reanimar!". Queria me curar das mazelas de um dia cheio e impiedoso. Saí da aula e fui conferir o evento.
Infelizmente cheguei depois da apresentação da banda. Senti tudo meio esquisito. Senti hostilidades e perturbações. Calças, camisetas quadriculadas, casaquinhos fashions e toquinhas de cabelo coloridas com óculos de grau anti-reflexo passeavam de uma ponta a outra com baforadas de cigarro e goles escondidos de bebidas alcoólicas. O estilo dos futuros publicitários. Um cara desafinado tocava Planta e Raiz e Zeca Baleiro no violão elétrico. Por pouco não rolou um Charlie Brown Jr.
O meu endométrio descamava, isquemiado, pela contração das minhas artérias espiraladas: antojo e queda de pressão. Frio.
Dirigi encolhendo os olhos, fugindo da claridade dos faróis e dos sinais. Dirigi com o vidro fechado, sentindo frio e evitando o barulho intenso externo. Estava chegando atrasada em mais um compromisso. Pelo menos uma notícia boa: Congratulations, You improved your English.
Finalmente casa. Agora eu poderia estudar tranquila para a prova de Ecologia Comportamental, poderia falar com bases científicas sobre Altruísmo e Egoísmo; Sobre a equação de Hamilton; Sobre cuidado parental e os Dilemas de vida dos animais, mas infelizmente a cefaléia me parasitava sugando todo o resto de paciência e vontade de aprender, sugando todo o resto são que minha mente ainda preservava.
Às duas da manhã dei baixa no Hospital São Lucas. Fui consultada por um neurologista cinquentão e duas enfermeiras que me serviram pra trocar o soro, me cobrir e dar o medicamento. Não lembro muito bem o que aconteceu, eu não conseguia abrir os olhos e não escutava mais nada direito. Ouvia palavras pronunciadas à toa "dipirona", "enxaqueca", "estresse" bem enquanto me transformava num ser humano letárgico, apático.
¹Distro é: Rafaum Costa: guitarra e voz; Vinícius Menna: guitarra e voz; Beloni Uchoa: baixo; Artur Araújo: bateria. Contatos: http://www.myspace.com/distrorock distroband@hotmail.com (84) 88031396.
Revisão de Texto: Priscila Adélia (jornalismo) e Gustavo Sena (medicina).