verdade viva °°°: junho 2008

11.6.08

O tempo em que as economias eram gastas em banquinhas em frente à Escola ninguém esquece. Retorno aos tempos em que comprava pirulitos que vinham em saquinhos com açúcar e chocolates caseiros que tinham formas de peixes coloridos. Era a mesma oração diária. Aula, esporte, compra de doces, condução, casa e - telefone. Eram horas trancada no quarto a falar no aparelho com as boas e íntimas amigas sobre as boas e más influências das pessoas sobre nossas vidas...

O 'virtual' banalizou a voz assim como o 'redial' banalizou o 'ao vivo'.

Feliz sou eu, que aos dois patinhos na lagoa, tenho meu telefone a tocar depois de um "estou me sentindo só" e uma voz calorosa que diz em tom de conforto brincalhão "ôôô, não fica assim!". Involuntariamente o sorriso surge e aquela armadura de pseudo-aço se rompe e desabafa sobre o medo do escuro.

Concordamos aqui que nada substitui o abraço real e o "olhos nos olhos quero ver o que você diz" (na nova versão seguida de 'ao sentir que com você posso ser mais feliz' - certamente esperaríamos com o peito acelerado algum gesto de reciprocidade se um dia cantássemos tamanha ternura). Mas, tendo aqui que se caçar com gato, devido ao eficiente trabalho das carrocinhas, o telefone até que quebrou um super galho numa noite não chuvosa, mas de bater os queixos até dos que neste plano não mais existem.

Sabe quando a orelha direita esquenta tanto, mas o papo tá tão gostoso que você não quer perder nem um quê que seja e interrompe (com dó) esperasóumpouquinho-podecontinuar e troca logo pra orelha esquerda? Pois bem...

Minha felicidade consiste em saber que não estou tão velha como eu supunha. Minha adolescência às vezes me vem à tona e me vejo perguntando pra algumas amigas se elas achariam legal se eu convidasse aquele gatinho maroto pra ser meu par na quadrilha da festa de São João.

O mais fantástico é o poder de raciocínio que nós mulheres temos, pra em poucos segundos contabilizar, interpretar e discutir (ou discutir e interpretar) hipóteses a respeito de uma possível atitude de um rapaz em relação a alguma garota que seja uma potencial 'rival'; ou em relação à confidências dele para com amigos; ou até mesmo em relação ao que ele pensa sobre nós, seus apêgos.

E não vendo nisso tudo um tipo de papo-cultura-inútil-fútil a gente permanece horas bolando estratégias e citando Maquiavel pra se descobrir uma maneira de sutilmente se fazer notar e sutilmente seduzir. Essa é a parte fácil.

Conversas ao telefone também rendem boas gargalhadas, principalmente se uma das emissoras do sinal tem o dom de arrancar hahahás prazerosos daquela que tem hahahás pendurados frouxamente nas cordas vocais.

Desligam não porque se cansam, mas porque precisam desligar. Afinal, se lembram que não são mais adolescentes e que a manhã seguinte vai expulsá-las da cama com muitas responsabilidades a serem cumpridas.

3.6.08

Regresso

no peito o sufoco de um dia que não foi gritado,
o sufoco de um dia maltratado.
no peito o desgosto que regressa,
a solidão que atravessa o pensamento e que dissipa qualquer tentativa inútil de sobriedade.

fim de tarde.

na boca o vazio, o oco, o vão.
sem palavras, sem pronúncia,
sem aconchego, só renúncia,
tanta falta de atenção.

na boca o indigesto, o mau-hálito,
o resto.

olhos de botão,
claros feito um raio
e no corpo um espinho

no espelho minha alma que sem calma me pergunta
o que diabos está fazendo ali no chão, um pouco torta.

implume, tenta voar
não sabe que vai cair
pois a pena que lhe falta
foi morar longe dali.