Eu tenho dois filhos e adotei mais um quando viajei para a África. Sem nome de batismo, negro e desnutrido, entregue aos abutres que rondam não só a Adis-Abeba, mas toda aquela região leste do continente.
Foi tão voraz ao primeiro contato com meu seio que a dor que senti foi maior que qualquer dor física, porque cheguei a conclusão que aquele bebê nunca havia ingerido sequer uma gota de leite. Era miúdo, pequerrucho, olhos amarelos contrastantes com sua pele seca e negra. Pesava menos da metade que seus novos irmãos, quando ainda eram donos de três e cinco quilos respectivamente.
Foi uma criança que necessitou do meu alimento, e o meu corpo estava pronto para nutri-lo de todas as formas. Meu corpo, alma e coração. E o prazer que eu sentia ao amamentá-lo foi o prazer que senti ao alimentar os meus outros bebês. Havia uma força nos unindo, como se estivéssemos ligados um ao outro, como se aquela fusão já tivesse sido prevista para acontecer, como se de certa forma o destino estivesse me embalando em uma cadeira de madeira cor de terra e em meus braços meu novo filho, saído do meu ventre. Um filho que já era tão meu que eu conseguia fechar os olhos e sentir a dor do parto, o momento da chegada daquele novo ser, que crescia e ficava mais forte a cada dia.
Eu sofri preconceitos devido a sua raça, devido a sua cor, mas eu sorria para as pessoas ao meu redor porque o vírus da felicidade havia me infectado. E eu já estava infectada antes mesmo de receber o dinheiro da herança do meu avô, com o qual decidi viajar para a Etiópia. E eu trouxe de lá o meu filho perdido, o meu filhinho que estava a minha espera havia alguns dias, enquanto que os familiares rezavam por presentes parisienses. A África sempre me encantou, desde menina, eu sabia que algo especial me esperava por lá.
E, então, o encontrei naquele barranco de barro batido olhando para o céu empoeirado onde aves fúnebres já comemoravam uma suposta e ilusória vitória.
O meu filho, tão e somente meu, que hoje sai a passeio segurando as mãos de seus irmãos e tem brilho nos olhos e um sorriso estampado no rosto.
Depoimento: V. dos Sonhos.
2 Comments:
APLAUSOOOOOOOSSSS!
Sem comentários!
Quando eu crescer quero ser igual a tu...
;)
AMO!
você também tem um fascínio pela áfrica?
eu sim.
e cuba também.
juntarei dinheiro e vou pra algum desses dois lugares um dia.
te chamo com antecedecia, é claro.
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