In memoriam...
Perdi a concentração ao ouvir os sussurros que me alcançaram por trás. Segui o ruído lentamente até o quarto e descobri o rádio-relógio branco numa frequência longínqua. Chiava baixinho, choroso, como se estivesse resmungando palavras difíceis de se dizer.
Nunca perguntei aos meus pais quando aquele rádio-relógio viera parar aqui em casa.
E não faz muito descobri que minha mãe pintara-o de esmalte escuro após alguns meses sendo acordada com o som da campainha e uma luz clara que acendia na hora programada.
Marcava 20:20 quando o desliguei, mas já não lembrava mais o que deixara meu olhar fixo na bicicleta colada na minha parede azul. Uma bicicleta que mais parecia saída de um papel de carta. Pena minhas alunas não terem tido aquela infância de colecionar papeis de carta.
Acho que minha concentração estava bem distante. Tentava buscar nas minhas gavetas mentais meu primeiro registro de memória. E definitivamente, não consegui. Fiquei entre o dia de São Cosme e São Damião, onde um senhor segurou minha mão e a fechou com um caramelo dentro; e entre o dia em que lancei minha chupeta pela janela da minha casa e a vi caindo sem chance de salvação boeiro abaixo. Estará no Rio de Janeiro a minha memória mais antiga?
Com toda essa guerra civil, com todo o caos e maldição de uma cidade maravilhosa e cheia de encantos mil, lá estou, na Vila Valqueire, em Jacarepaguá, dando uma volta na bicicleta Caloi cinza do meu irmão pelo quarteirão. Foi a primeira vez que pedalei sozinha e que pedalei mais rápido, porque meu objetivo havia deixado de ser conseguir dar a volta no quarteirão inteiro, mas sim de conseguir voltar ao campo de visão do meu pai. Meu pai não estava na outra rua e não viu quando pedalei em pé, com toda a força de uma criança de 4 anos de idade que já havia descartado as rodinhas.
No Google maps não vi mais as mangueiras do meu tempo, nem a praça perto da minha casa, nem a minha casa.
Será que a minha infância um dia existiu?
Perdi a concentração ao ouvir os sussurros que me alcançaram por trás. Segui o ruído lentamente até o quarto e descobri o rádio-relógio branco numa frequência longínqua. Chiava baixinho, choroso, como se estivesse resmungando palavras difíceis de se dizer.
Nunca perguntei aos meus pais quando aquele rádio-relógio viera parar aqui em casa.
E não faz muito descobri que minha mãe pintara-o de esmalte escuro após alguns meses sendo acordada com o som da campainha e uma luz clara que acendia na hora programada.
Marcava 20:20 quando o desliguei, mas já não lembrava mais o que deixara meu olhar fixo na bicicleta colada na minha parede azul. Uma bicicleta que mais parecia saída de um papel de carta. Pena minhas alunas não terem tido aquela infância de colecionar papeis de carta.
Acho que minha concentração estava bem distante. Tentava buscar nas minhas gavetas mentais meu primeiro registro de memória. E definitivamente, não consegui. Fiquei entre o dia de São Cosme e São Damião, onde um senhor segurou minha mão e a fechou com um caramelo dentro; e entre o dia em que lancei minha chupeta pela janela da minha casa e a vi caindo sem chance de salvação boeiro abaixo. Estará no Rio de Janeiro a minha memória mais antiga?
Com toda essa guerra civil, com todo o caos e maldição de uma cidade maravilhosa e cheia de encantos mil, lá estou, na Vila Valqueire, em Jacarepaguá, dando uma volta na bicicleta Caloi cinza do meu irmão pelo quarteirão. Foi a primeira vez que pedalei sozinha e que pedalei mais rápido, porque meu objetivo havia deixado de ser conseguir dar a volta no quarteirão inteiro, mas sim de conseguir voltar ao campo de visão do meu pai. Meu pai não estava na outra rua e não viu quando pedalei em pé, com toda a força de uma criança de 4 anos de idade que já havia descartado as rodinhas.
No Google maps não vi mais as mangueiras do meu tempo, nem a praça perto da minha casa, nem a minha casa.
Será que a minha infância um dia existiu?
3 Comments:
Saudade?
Fazia tempo que não via você por aqui.
Na verdade, faz tempo que não te vejo em canto nenhuma.
Saudade (L)
;***
tic-tac.
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